O PEQUENO MUNDO DE JOHNNY DEPP

​A utopia do mundo é voltar a ser a vila que um dia foi – quando a humanidade dava seus primeiros passos – e a internet, com suas redes sociais, é a ferramenta certa para a redução das distâncias. E é por isso que eu sei que os meus vizinhos de vila Johnny Depp e Amber Heard estão nesse processo de separação depois de coabitarem por dois anos na casa 18. Eu moro na 16, e os vizinhos da 17 – um casal de mórmons – garantem que, se alguém batia em alguém na 18 era ela, não ele. Já os irmãos da 19 – gêmeos de esquerda – juram, de pés juntos – são quatro –, que o Sweeney Todd da história é ele, não ela. Na reunião de condomínio que aconteceu semana passada para discutirmos o assunto, foi preciso separar os moradores da 17 e da 19, que mutuamente se socaram na intenção de sustentar suas respectivas versões opostas. Acabaram ambos cancelados – o que está registrado em ata – e só não houve linchamento físico porque a polícia do condado foi chamada – o que não está registrado em ata – e porque o Will Smith, que mora na 25, não pôde estar presente por motivo de viagem.

​Agora veio a sentença: Amber perdeu o processo que movia contra o ex e foi condenada a pagar quinze milhões – ou oito, a depender da boca da Matilde – com direito a receber dois de troco por Johnny ter inventado uma história para os policiais que eu ainda não sei qual foi, mas que a dona Candinha subsíndica certamente sabe.

No tribunal da Virgínia – a duas quadras daqui – falou-se em “abuso doméstico”, “abuso mútuo”, “gatilho” – emocional, não de revólver –, “vício em opiáceo”, “prática idiossincrática de sexo com garrafa”, “Johnny Depp x Johnny Walker” e “ponta de dedo anelar decepada durante discussão acalorada”. A psicóloga forense Shannon Curry pôs pimenta no imbróglio ao atestar que Amber sofre de “transtorno de personalidade limítrofe” e “transtorno de personalidade histriônica” impulsionados por “medo subjacente de abandono”. Já a psicóloga Dawn Hughes, da equipe jurídica de Johnny, defende que o ator está em “estresse pós-traumático” e precisa urgentemente voltar ao set de “Piratas do Caribe” para que não use suas “Mãos de Tesoura” num acesso qualquer de raiva.

Calma, Edward. Lembra dos tempos de “Cry Baby”, que te catapultou para a fama, e onde tudo era doce e ingênuo como um passeio de Buick pela Baltimore de John Waters, e uma lágrima escorria de seu belo e jovem rosto.

​Os irmãos da 19 contaram na reunião que, com seus dois pares de ouvidos – gêmeos – encostados à parede da casa contígua, foi possível entreouvir uma conversa de Johnny com um amigo não-identificado em que o ator dizia: “Vamos queimá-la e depois afogá-la para termos certeza de que está bem morta”. Como não foi possível refutar a acusação, Depp – apavorado com a repercussão na deep web – justificou-se dizendo que tudo não passou de uma piada de mau gosto baseada no humor demolidor do grupo Monty Python – que, de fato, não costumava deixar pedra sobre pedra quando o assunto era o sexo oposto.

​Agora um outro casal da vila resolveu também se separar e postou vídeo-explicação do tipo “fiquem tranquilos, estamos melhores que nunca”. Como ele é um youtuber bombado, com 724 mil inscritos, achou por bem dar uma satisfação à sociedade. (Não vou mencionar seu nome, pois ele pode não gostar de ver sua privacidade aqui exposta.) O vídeo, que, até este momento, dezessete horas depois de baixado, já acumula 174 mil visualizações e 25 mil curtidas, mostra o casal sorridente falando com orgulho do divórcio, como se comentassem o nascimento de um neto ou o ingresso na universidade da caçula.

São fofos, e tudo o que querem é ser amados e monetizados, mas sabe como é: os haters não costumam ter muita tolerância para com os fofos que dão explicações sobre suas vidas à luz de Freud e Schopenhauer.

Acontecendo novas reviravoltas, eu conto. Ou então nos encontramos no Insta – o barzinho aqui da esquina.

Rodrigo Murat é escritor

Imagem de jodiandbrett por Pixabay
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