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SIMPATIA PARA 2021: SEJA SIMPÁTICO

SIMPATIA PARA 2021: SEJA SIMPÁTICO

Toda manhã pule três ondinhas e agradeça ao joelho por ainda te levar aonde você não iria. Começa assim um dia belo e útil. Seja fútil, mas sem exagerar, que tudo o que é exagerado cansa, e você não está aqui para ser uma caricatura de si próprio – a não ser que você já tenha virado, mas ainda há tempo. Sempre determine o Já e o Ainda. Todo ano que começa, uma hora finda. Fôssemos infinitos, tudo mudaria. Como somos finitos, muito permanece. Abra um livro ao acaso e: folheie, fareje, farfalhe, tateie. Livros têm cheiros e são sensíveis aos dedos. Verifique a conta: é você que vai pagar. Pergunte: o que é isso? Tudo tem um nome, mas talvez você possa dar outro, ou então, caso você seja dos que preferem um termo da moda, talvez você possa “ressignificar”. Mas lembre-se: modas passam e passam a incomodar. E atenção aos reclames: um bom propagandista transforma um monte de esterco em local de veraneio. Use roupas leves e verbos de ligação – ser, estar, andar – e seja, esteja e ande até o próximo que de você está distante. Abra mão de ser o centro do universo. Aqueça o sol de terceiros e peça a quartos que aqueçam o seu, ou nem isso: deixe que ele se aqueça solzinho. Desloque-se sem fazer a louca, o louco, o descompensado ou o Luisinho Quatorze. “O Estado sou eu”, uma ova. No máximo “Eu sou o Estado e tenho estado nesse estado de nervos e você e ela e ele e todos que sobrevivemos a este ano-cão e estamos agora aqui ganindo”. Ao cortar cabelos, pelos, unhas, lembre-se de desbastar o ego, que é onde você mais cresce. Na mudança de lua, a luva nova segura a lua velha uma noite inteira nos braços. Não se esqueça de olhar o céu – principalmente em ambientes fechados. Diga coisas surpreendentes que não firam o semelhante que de você é diverso. Sobretudo divirta-se e deixe que os outros se divirtam – de sobretudo ou sem nada – que a diversão alheia não é ameaça à sua. O que seria do amarelo se todos chupassem laranja? Alegrias, as desmedidas; prazeres, os transparentes. Viaje, namore, passeie, esperneie, espante-se, mas lembre-se: nada disso é importante quando não acontece. Outras coisas estarão acontecendo no lugar. Daquilo que dissemos, o que agora é falso? Tudo ou alguma coisa? Com quem contamos ainda? Somos o que restou, lançados fora da corrente viva? Ficaremos para trás por ninguém compreendidos e a ninguém compreendendo? Precisamos ter sorte? Isso você pergunta. Não espere nenhuma resposta senão a sua. Agora rasgue esse receituário e escreva o seu.
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Os trechos em itálico são versos de Bertolt Brecht extraídos do livro “Poemas 1913-1956” da Editora 34 na tradução de Paulo César de Souza.

Rodrigo Murat é escritor e escreve no blog rodrigomurat.wordpress.com

Imagem: Pixabay

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